A Escola




A ausência de uma estética brasileira para construções em aço também é um grande obstáculo a ser superado", lembra o arquiteto mineiro Gustavo Penna. "Precisamos de criatividade. Hoje praticamente não há inovação e o que prepondera é a citação do que já existe. O Brasil criou uma estética em concreto, então, por que não pode criar uma com o aço?", questiona Penna, autor de diversos projetos concebidos em estrutura metálica, como a Escola Guignard, em Belo Horizonte, e o Expominas, também na capital mineira, onde o aço foi empregado para obter, nos três pavilhões, vão livres de 75 m e pés-direitos de 17,50 m. Zanettini concorda e defende a exploração da tridimensionalidade inerente à estrutura metálica. Para ele, não faz sentido tentar conferir ao aço a robustez da pedra, o calor da madeira, a plasticidade do concreto ou a maleabilidade do plástico. "Fazer isso é não entender a gramática e a semântica da construção em aço, ou seja, é não expressar de modo correto a sua linguagem", ensina.

O sistema não peca em tecnologia para aumentar as opções de uso – a evolução, aliás, anda a passos largos. Para proteção passiva, por exemplo, já há uma série de recursos de proteção ao fogo, caso das fibras projetadas, da argamassa projetada à base de vermiculita, das placas de lã de rocha e de gesso acartonado, além das tintas intumescentes e do enclausuramento com concreto. Ao mesmo tempo, os próprios perfis vêm evoluindo, adquirindo maior flexibilidade de aplicação, com novos desenhos e abas assimétricas, e maior resistência, o que garante maiores vãos.
Uma evidente composição com a montanha distingue a Escola Guignard de outras edificações do bairro de Mangabeiras, em Belo Horizonte-MG. Numa referência à sinuosidade da paisagem local, a equipe de Gustavo Penna desenhou uma estrutura curvilínea, que foge à retidão "natural" dos elementos metálicos, configurando uma praça, um abrigo e um mirante. Um abraço ao mundo, nas palavras de Penna.
A escola ostenta quatro pavimentos, todos estruturados em aço, fechados com paredes de alvenaria e acabamento em argamassa colorida texturizada. Desenvolve-se a partir da cota superior do terreno, em que o edifício principal acompanha a curvatura da rua de acesso. O bloco, que contém salas-ateliês, oficinas e galeria de exposições, conecta-se a um auditório subterrâneo, sobre o qual repousa o anfiteatro gramado para reuniões e espetáculos ao ar livre. O volume emerge novamente, na cota mais baixa do terreno, para configurar o mirante cívico, que liga a escola à rua inferior.


Essa manobra matemática marca também a aparência externa do conjunto. Visto de fora, a partir da rua que circunda o limite inferior da área, o edifício aparenta uma robustez ciclópica, referência evidente à Serra do Curral, muralha sul de Belo Horizonte, onde está o bairro de Mangabeiras. Os grandes pilares cilíndricos emergem da terra para lembrar os inúmeros afloramentos rochosos de itabiritos, xistos ferríferos que caracterizam a paisagem local. E o aparente brutalismo da obra completa-se com capitéis de aço sugeridos pelo projeto estrutural e incorporados esteticamente à arquitetura. A solução foi necessária para reduzir as deformações nas ligações viga-pilar
A cobertura do edifício principal foi resolvida com um pano contínuo de chapa de aço com 3 mm de espessura, que substitui telhados e lajes. Mas a solução aparentemente simples e racional acabou transmitindo tensões indesejáveis entre os tres segmentos do edifício separados por juntas de dilatação. A falha foi detectada após o surgimento de algumas fissuras na alvenaria e corrigidas com a execução de juntas também na cobertura. Abaixo dela, dois reservatórios metálicos com capacidades de 18 mil litros e 5 mil litros ocupam quase todo o vazio da cobertura para armazenar a água de consumo e melhorar o conforto térmico no interior das salas. Outro detalhe curioso da obra encontra-se no anfiteatro: uma das extremidades da arquibancada completa-se com uma escada de aço móvel, para acesso de veículos ao palco do auditório subterrâneo. Um dispositivo hidráulico aciona essa pesada porta, quando necessário.
Dentro, nas oficinas e espaços de trabalho, o cuidado no desenho é visível em lavatórios, corrimãos, portas e caixilhos, que impressionam mesmo ao mais desavisado visitante. Gustavo Penna explica que a idéia central do projeto foi criar ambientes de trabalho, como oficinas, adequados para moldar argila e concreto, soldar, fundir, pintar e viver. Por isso a opção pela luz zenital em todos os ambientes da escola. Por isso, a grande praça gramada, sobre o auditório, entre a Guignard e a vista de Belo Horizonte
Repleto de simbolismos, o projeto do escritório Gustavo Penna & Associados revê a tradição de Minas Gerais numa linguagem universal e contemporânea
Caminho heróico


"...O Brasil ainda não descobriu a linguagem do aço, nós ainda trabalhamos com um linguajar importado. Vamos lá fora ver o high-tech de Richard Roger, de Renzo Piano, dos arquitetos japoneses e tentamos reproduzi-lo. Ora, aqui a minha serra é de ferro, meu chão é de ferro. Eu tenho que tentar traduzir minhas necessidades interiores numa estética que ganhe corpo no edifício e que fale sobre as relações entre as pessoas, sobre o jeito como as pessoas se tratam, sobre as festas daqui... O projeto da Escola Guignard tem um movimento que lembra um trem mineiro, mas traz também a referência ao afloramento: para trabalhar um projeto numa região montanhosa não se pode desenhar um plano; ao contrário, a declividade é um dado fundamental de projeto. E a paisagem ao redor mostra a vegetação arbustiva e alguns afloramentos rochosos espalhados. A escola é um edifício de aço que aflora de uma montanha de ferro ..."  

Fonte: http://piniweb.pini.com.br/construcao/noticias/escola-guignardbelo-horizonte-mgtrem-ponte-mirante-do-planeta-84782-1.aspx


Ficha Técnica
Localização: rua Ascanio Bulamarqui, Belo Horizonte-MG
Área do terreno: 4 mil m2
Área construída: 7.500 m2; 14 salas-ateliês, 500 m2 de oficinas, galeria 1000 m2, anfiteatro para 2 mil pessoas e auditório para 400 pessoas
Ano do projeto: 1989 (1a fase) e
1990 (2a fase)
Conclusão da obra: 1994
Estrutura Metálica: TMIL-Tecnologia de Montagem Industrial
Aço: SAC-41 e SAC-50 Usiminas

Esquadrias: Complemig
Luminárias: Iluminar
Serralheria especial: Temac
Argamassa colorida de revestimento: Central Beton
Equipe Técnica
Obra: Escola Guignard - Universidade Estadual de Minas Gerais
Contratante: Diretoria de Obras Especiais do Deop-MG
Projeto de Arquitetura: Gustavo Penna Arquiteto & Associados; Autor do projeto: arq. Gustavo Penna; Colaboradores: Adalgisa L Mesquita, Afonso Walace Oliveira, Delio M.B. Cardoso, João Batista de Assis; Fernanda Arruda Guillen, Norberto Bambozzi, Osmar
Fonseca Barros
Projeto de estrutura, elétrica e hidráulica: Leme Engenharia( eng. Paulo
Marcio Veloso)
Projeto de acústica, sonorização e iluminação espectacular: Bomsibel
Projeto de iluminação: Iluminar
Construção: Tecplan Engenharia
Fotos: Jomar Bragança
MARCOS DE SOUSA

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